Baixo Vouga Lagunar: diques são solução
Dar continuidade ao projeto de proteção do Baixo Vouga Lagunar (BVL) e concluir o dique é uma das soluções apontadas por um estudo elaborado no âmbito do programa Erasmus e apresentado no workshop “Dois Temas: Gestão da Água e Intervenção Territorial Integrada”, realizado na última semana em Estarreja no âmbito do projeto F:ACTS, na Biblioteca Municipal de Estarreja.
Para o presidente do Município, José Eduardo de Matos, que abriu esta sessão, “a participação da Câmara Municipal de Estarreja neste programa F:ACTS aprofunda a nossa preocupação de sustentabilidade e promove o maior conhecimento de uma área cheia de potencialidades”, congratulando-se por ver no auditório da Biblioteca Municipal, parceiros e entidades que há muito lutam pelo mesmo objetivo.
Por outro lado, refere José Eduardo de Matos, paralelamente “à nossa reivindicação política regional para o avanço do projeto do Baixo Vouga, estas ações chamam a atenção e antecipam riscos que requerem inadiáveis intervenções há muito necessárias”.
O exercício realizado no âmbito do programa Erasmus, por um grupo de 44 estudantes, de 13 nacionalidades e 4 universidades, explorou cenários e alternativas de intervenção no BVL, na procura de soluções para os problemas da diminuição de produtividade de atividades tradicionais, degradação da base ecológica de recursos e ausência de alternativas ou oportunidades socioeconómicas.
A opção “Proteção” contra o avanço da água salgada naquele espaço é uma das soluções defendidas pelo grupo que ainda no âmbito de medidas infraestruturais aponta a criação de pequenas barragens de controlo de água doce e proteção das áreas agrícolas e a eliminação de espécies exóticas tendo em vista a defesa da paisagem do Bocage.
O estudo apresentado por Filomena Martins, do Departamento de Ambiente e Ordenamento da Universidade de Aveiro, analisou também a opção “Adaptação”, que admite a salinização de terrenos a norte e a introdução de culturas mais resistentes à presença do sal, mantando-se a agricultura tradicional nas zonas não salinizadas e o incremento de atividades ligadas à observação da natureza.
Polis da Ria de Aveiro estuda prolongamento do Dique Sul
A solução foi apresentada por Luís Bandeira, Sociedade POLIS da Ria de Aveiro, e assenta na reutilização de dragados nos canais da Ria. Ou seja, a execução do prolongamento do dique sul até ao Rio Vouga pode recorrer ao depósito de materiais dragados, numa solução económica e ambientalmente vantajosa.
Esta opção foi estudada pela Polis Litoral Ria de Aveiro, cujas conclusões dos estudos promovidos serão apresentadas em junho. Foram inspecionadas 43 estruturas de proteção e definidas zonas prioritárias, nas quais se enumera o dique do BVL.
Amplitude de marés é hoje o dobro de há 100 anos
O anteprojeto do sistema de defesa e controle dos efeitos das marés, que desde os anos 90 defende a construção do dique, esteve novamente em análise desta vez por este grupo de trabalho do F:ACTS que envolve 8 países europeus.
Pedro Brito, da Direção Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural (DGADR), relembrou os pontos fortes do tão falado projeto do Baixo Vouga, sublinhando a fragilidade dos sistemas primários de diques de proteção face aos novos efeitos crescentes das marés. Em 1905 a amplitude das marés vivas era de 1,45m, em 1990 subiu para 2,50m. E em 2006, a amplitude sobe para mais do dobro, 3,73m.
O reforço do dique existente a sul e a norte é a principal intervenção defendida por este anteprojeto, para defender o solo da água salgada, complementando com a criação de estruturas hidráulicas no Rio Velho, em Canelas, Salreu e no Rio Antuã. O projeto prevê ainda a defesa e controle de cheias, uma vez que a zona é ainda um local de descarga do Vouga, Antuã e de diversas linhas de água, através do reforço de diques, reabilitação de valas, implantação de descarregadores de cheias, reforço da vazão do esteiro da Linha e do Rio Jardim e o desassoreamento do leito do Antuã.
“Importa corrigir esta situação intervindo nos sistemas de defesa das marés e cheias, seguindo critérios ajustados aos níveis preconizados para uso dos solos”, afirmou Pedro Brito lembrando que o Estudo de Impacte Ambiental foi aprovado em 2001 e a Declaração de Impacte Ambiental favorável e datada de 2002 é válida até 2013.
Zona continua em risco
Referenciado pelo presidente da Câmara Municipal na abertura da sessão, Casimiro Calafate, presidente da Junta de Freguesia de Cacia, agradeceu a abordagem. “Ele sabe que há muitos anos que ando à volta disto. Somos uns grandes defensores do Baixo Vouga”. O agricultor apela ao bom senso dos governantes deste país para que “olhem para este Baixo Vouga e outros que existem neste pais e que os defendam. Precisamos de ter alguma independência na parte alimentar”.
Estas soluções não são novidade para o autarca, que foi durante 10 anos presidente Associação de Beneficiários do Baixo Vouga. Agricultor em tempo parcial, hoje com 66 anos, lembra que aos 6 anos “já andava com o meu avô junto à ria, porque se produzia lá arroz, e tapávamos a água salgada com uma enxada e com a lama”. Um cenário que se alterou profundamente e por culpa da ação direta do homem. “O Estado é o responsável”, afirma lembrando as consequências negativas das obras na Barra do Porto de Aveiro.
Para este acérrimo defensor do projeto de defesa do BVL é “chocante que venham os jovens dizer que somos criminosos com o nosso território e o deixamos abandonado”, afirma referindo-se ao estudo do Erasmus. Casimiro Calafate reafirma que “é um crime o que se está a fazer ao Baixo Vouga mas sobretudo ao território nacional, que é dos melhores que temos em termos agrícolas e ambientais e ninguém tem tido a sensibilidade para o defender como deve ser”.
Maior envolvimento no terreno, defende DGADR
Filipa Horta Osório, subdiretora da DGADR, considera que “não estão exploradas todas as soluções para a região” salientando a importância dos momentos de reflexão. “É necessária muita discussão e um maior envolvimento de todos os intervenientes no terreno, que é exatamente o objetivo deste workshop”, referiu.
O não avanço do anteprojeto no terreno não se deve por isso a questões financeiras, assegura a responsável. “A construção de todos os diques pode não ser a melhor solução para a biodiversidade e a manutenção de um sistema de agricultura conciliador com o ambiente e natureza”.
O Baixo Vouga Lagunar constitui uma das áreas em estudo no âmbito do programa INTERREG IV-C, designado por F:acts! - Forms for: Adapting to Climate change through Territorial Strategies!”, por ser uma zona ameaçada quer pela intrusão de água salina, quer pelas cheias que têm vindo a afetar os terrenos agrícolas. Foram escolhidas cinco áreas sensíveis, localizadas em países europeus, para constituírem os projetos-piloto desta ação.